No Verão de 2008, a Direcção-Geral das Contribuições e dos Impostos (DGCI) fez leiloar a Capela de Nossa Senhora das Dores no concelho de Valpaços, distrito de Vila Real, fixando-lhe uma base de licitação que não chegava aos 10 euros. A capela pertencia a um particular que tinha dívidas ao fisco e este, zás, leiloou o templo. O valor quase ridículo da base mínima de licitação tem a ver com o valor matricial da capela.

Á data, numa das minhas reflexões escritas, fiz referência a esta curiosidade fiscal num texto cujo título impressionou alguns dos meus leitores. “Leilão rima com cambão” era o título que remetia para essa figura do chico-espertismo que é o cambão, ou seja, um conluio prévio entre interessados para fazer baixar os preços nos leilões e possibilitar o açambarcamento da praça.
 
Não foi, seguramente, o caso da Capela de Nossa Senhora das Dores, em Valpaços –  cujo destino, marcado pelo leilão da DGCI, desconheço -, nem dos leilões de imóveis, menos conseguidos do que concorridos, que se anunciam por aí com supostos descontos que, dizem, chegam a atingir 50% do preço de mercado. Até já foi posta a leilão uma casa, com licença de habitabilidade presume-se, que tinha por base de licitação 1 euro (duzentos escudos e picos na moeda antiga).
 
Já não há leilões com cambões e muito menos no mercado imobiliário. Seria insuportavelmente suspeito que as licitações tivessem tectos combinados, para que alguns produtos imobiliários pudessem ser arrematados a preços baixíssimos, artificialmente desvalorizados. Tal prática nem a quem vende e possa estar com a corda no pescoço beneficia. A desvalorização artificial dos preços no mercado imobiliário lesaria profundamente a Economia portuguesa.
 
Aproveitando uma situação em que o actual funcionamento do mercado imobiliário é incapaz de fixar, saudavelmente, preços de mercado, há quem, inconscientemente, ensaie tectos máximos para licitações em leilões de imóveis, quase como acontecia nos velhos cambões, e faça depois crer que esses valores serão, afinal, os de mercado. Um erro com contornos de esbulho em que é difícil identificar quem beneficia.
 
Não é – repito – seguramente a economia portuguesa nem as famílias portuguesas que na sua maioria são proprietárias das casas onde vivem, pois este fenómeno, que espero não se instale entre nós, atingiria todos, sem excepção, até mesmo aqueles que não pretendem vender os respectivos imóveis, mas que os veriam desvalorizar. De resto, leiloar nunca foi sinónimo de desvalorizar.
 
Luís Lima
Presidente da APEMIP
luis.lima@apemip.pt
 

Publicado no dia 27 de Setembro de 2011 no Jornal de Notícias e no Diário de Notícias

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