A credibilidade da agência de notação Fitch ficou, esta semana, muito comprometida quando, numa suposta atualização das estimativas para o mercado imobiliário português, veio a público dizer que os preços das habitações em Portugal deverão cair ainda mais.

Esta posição da Fitch mais parece um desejo de certos investidores internacionais (à espreita de chorudos negócios), do que uma projeção minimamente séria e fundamentada sobre a realidade do nosso mercado imobiliário que não vive, nem nunca viveu uma bolha como a que ocorreu nos Estados Unidos, onde esta quase centenária agência nasceu.

Esta mensagem da Fitch beneficia da linguagem cifrada que alguns economistas teimam em usar nas respetivas comunicações e da inclusão de números menos redondos como os que referem, por exemplo, uma quebra de 39 para 30% nos descontos aplicados quando se pretenderá vender rapidamente.

Com esta sentença, a Fitch diz, sem o provar, que o mercado imobiliário português estaria a viver em “rebaixas” médias de 39% por culpa de uma procura em queda pela crescente dificuldade de acesso ao crédito para aquisição de habitação própria. Com esta última verdade tenta justificar–se aquela ficção, muito conveniente para os fundos que espreitam o nosso imobiliário, tentando comprar a granel e a preços de saldo.

Indiciar, por exemplo, que Portugal tenha registado um enorme boom da construção a partir de 1998, com um aumento de um milhão de habitações exagerado face ao aumento da população residente, é ter o calendário adiantado e não saber nada da História recente do nosso país. Nem perceber a mudança de paradigma ocorrida neste mercado nos anos 80 do século passado, por força das alterações políticas e sociais então em consolidação.

Julgar que o facto de haver mais de 75% das famílias portuguesas que são proprietárias da casa que habita é um sinal de prosperidade e riqueza da população é não saber nada do que ocorreu em Portugal nos últimos 35 anos e, pior ainda, é fazer comparações entre países que não são, neste campo, comparáveis.

A agência Fitch, nascida e desenvolvida num país onde a maioria da população julga que Portugal é uma província da Espanha, diz que 13% do parque habitacional está devoluto sem associar tais valores à localização geográfica de tais habitações ou à degradação do próprio património imobiliário.

A Fitch precisará de acompanhar o mercado imobiliário português pois atribui “ratings” às obrigações sobre crédito hipotecário que são emitidas pelos bancos, mas seria suposto que conhecesse melhor a realidade do nosso país e não caísse no primarismo de comparar este mercado com outros mercados, europeus ou americanos.

Mais ainda, dizendo que os salários em Portugal têm subido a uma taxa inferior à dos preços das casas, a Fitch diz que o preço médio das casas portuguesas foi, em 2006, cerca de 131 000 euros (sete vezes o PIB per capita), valor que terá descido para 105.300 euros em 2010 (5,5 vezes o PIB), valor que – sublinha, ainda é superior ao de 1995, ou seja cerca de 42 000 euros, em projeção, isto é 3,7 vezes o PIB desse per capita ano.

Nem na matemática dois e dois são sempre quatro, como a Fitch deveria saber antes de tentar impor uma desvalorização do nosso património imobiliário, mesmo que isso possa ser conveniente para alguns investidores estrangeiros sem rosto.

Luís Carvalho Lima
Presidente da APEMIP
luislima@apemip.pt

Publicado dia 06 de Agosto de 2012 no Jornal i

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