Nada tendo contra a existência de leilões para a comercialização de bens legalmente transacionáveis, não sou frequentador dessas vendas públicas nem mesmo quando se anuncia que alguns produtos raros e apetecíveis, por exemplo obras de arte, vão à praça pública para ser arrematados pelo melhor licitador.
Alguns dos mais famosos quadros do Mundo têm sido vendidos em leilões, como é o caso recorde de uma das quatro telas de Eduard Munch da série “O Grito”, uma das obras mais importantes do expressionista, que este ano foi vendida num leilão por 119,9 milhões de dólares.
A leiloeira Sotheby’s – em cujas instalações de Nova Iorque decorreu o leilão – disse que sete interessados disputaram o quadro, durante 12 minutos, até à licitação final, a mais alta de sempre neste tipo de leilões, que superou em 40 milhões de dólares a melhor estimativa inicial para este quadro.
Se o quadro pertencesse a uma instituição bancária e se houvesse a garantia de que a transação dessa obra seria financiada a cem por cento por quem a levara a leilão, eu estaria presente e tentaria arrematar uma obra tão emblemática nessas condições excepcionais.
A lógica normal dos leilões, nomeadamente dos leilões que se organizam para escoar ativos imobiliários indesejavelmente acumulados, fica comprometida com o financiamento privilegiado do bem a adquirir, garantido por quem vende a quem compra.
A estas condições únicas alia-se, muitas vezes, a ideia largamente publicitada, de que os bens a leilão vão ser levados à praça com descontos enormes, de feira, e até nem falta, em países identificados onde esta situação ficou descontrolada, instituições que oferecem um a quem compra outro.
No caso português, menos grave, os leilões que adoptem estratégias comerciais deste tipo estão a generalizar a ideia, infundada, no caso de leilões de casas, que os preços dos imóveis em Portugal estão inflacionados provocando uma desvalorização geral do património construído.
A dificuldade em fazer encontrar a oferta com a procura no mercado imobiliário português, num quadro de escassez de crédito e de crescentes dificuldades no respectivo acesso, não pode ser apresentada, de forma simplista e precipitada, sob a aparência de bolha imobiliária que está subjacente a muitos leilões.
Em Portugal – já o disse várias vezes, os preços das casas não sofrem, há anos, qualquer processo inflacionário, característica essencial em qualquer processo de formação de uma bolha imobiliária, e existem, claramente identificados, interessados para uma grande parte da oferta imobiliária existente no nosso país.
Muitos destes interessados têm dificuldades em aceder ao crédito, mas a solução de facilitar esse acesso só para os produtos que interessa escoar mais rapidamente, longe de solucionar o problema de uma oferta sem procura, agrava-o pela desvalorização forçada e sem limites do património imobiliário.
Luís Lima
Presidente da APEMIP e Presidente da CIMLOP
Confederação da Construção e do Imobiliário dos Países de Língua Oficial Portuguesa
luis.lima@apemip.pt
Publicado no dia 24 de dezembro de 2012 no Diário Económico