Pelos vistos, a fazer fé na resposta que o eurodeputado português Nuno Melo recebeu da Comissão Europeia, cem mil euros no banco é o limite acima do qual tudo pode acontecer e em nome de quase tudo, incluindo desconfianças sobre a legitimidade de poupanças que ultrapassem aquele valor.

O presidente do Eurogrupo já disse e desdisse tudo sobre esta matéria no rescaldo das soluções excecionais para o polémico resgate da banca da República do Chipre, lá no Mediterrâneo mais oriental onde também circula o euro. Pensou-se então que a solução extrema encontrada para a capitalização da banca cipriota não serviria de exemplo a outras eventuais capitalizações, mas a Comissão Europeia já clarificou a situação.

Clarificação que, no caso, desmente os responsáveis políticos que vinham garantindo a excecionalidade da situação cipriota, entre os quais se inclui o Presidente da França, um dos chefes de Estado que aparentemente parecia em condições de exercer um contraponto à Alemanha da Angela Merkel, a quem assenta como uma luva esta indisfarçável vontade de castigar quem poupou mais de cem mil euros.

Como já disse neste mesmo espaço, as populações são muito generosas a perdoar erros e enganos dos políticos que escolheram, mas há erros imperdoáveis e nestes estará, seguramente, o que  imponha a perda de um tesouro legitimamente acumulado, tesouro que pode continuar a ser um pé-de-meia para acudir a uma situação de emergência mesmo que o seu valor seja superior a cem mil euros.

A Comissão Europeia diz, agora que a memória do Chipre já lá vai, que este exemplo da operação de resgate de Chipre, pode repetir-se na Europa e atingir os depositantes com verbas acima dos 100 mil euros, elegíveis para contribuir futura e involuntariamente, ou seja à força, em operações de reestruturação das instituições bancárias que detêm  essas poupanças.

O próximo Chipre poderá ser a Eslovénia, território que já fez parte do Império Romano, do Império Bizantino, da República de Veneza, do Sacro Império Romano-Germânico, da Monarquia de Habsburgo, do Império Austríaco, do Império Austro-Húngaro, do Reino da Jugoslávia, da República Socialista da Jugoslávia e agora faz parte da União Europeia onde parece não ser totalmente seguro ter mais de cem mil euros num banco.

O remanescente pode ser desviado para salvar sectores bancários locais em crise, aliviando assim a carga dos contribuintes se esses sectores bancários tivessem de ser salvos pela intervenção dos dinheiros públicos do Estado. Neste caso, o Estado intervém e salva a banca mas com o dinheiro dos particulares. É uma doutrina nova, ou talvez não.

O risco dos efeitos colateriais do resgate cipriota, a anteceder um fim-de-semana para ganhar tempo precioso para acalmar as opiniões dos depositantes bancários legitimamente inquietas, foi ultrapassado na Europa, mas o espectro desse confisco volta a pairar sobre alguns europeus, sob suspeitas terríveis pelo simples facto de possuirem mais de cem mil euros num banco.

Não parece uma decisão política aceitável e pode até gerar efeitos secundários muito graves para lá da desconfiança já instalada relativamente a certas instâncias.

Luís Lima
Presidente da CIMLOP
Confederação da Construção e do Imobiliário de Língua Oficial Portuguesa
presidente@cimlop.com

Publicado no dia 13 de maio de 2013 no Jornal i

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