Naquela linguagem enviesada dos relatórios altamente técnicos onde para se dizer que não há bolha imobiliária diz-se que existe evidência da ausência de uma bolha, neste estilo, o Banco de Portugal, mesmo considerando a inexistência, entre nós, da bolha que atingiu alguns mercados imobiliários, como o de Espanha ou o dos Estados Unidos, admite que “não serão de excluir correções adicionais dos preços”.

Esta última expressão, na boa linguagem com que são tratados os assuntos económicos, quase seria justa e certa não incluísse ela a palavra fatal “adicionais” que aponta para a manutenção da injusta tendência para a desvalorização artificial dos preços. Na verdade, não devem ser de excluir correções de preços, mas em sentido contrário, ou seja, com uma tendência crescente para a valorização. Doa a quem doer.

Já não há aumento significativo da oferta, havendo até escassez de oferta em algumas localizações, o que é um pouco, para não dizer bastante, diferente do que se pode ler no recente relatório do Banco de Portugal, documento que pretenderá justificar o injustificável – uma forçada desvalorização do património construído que, na prática, a concretizar-se significa um quase esbulho das poupanças acumuladas por várias gerações de portugueses para investir em habitação própria.

Insistir na ideia da inevitabilidade de mais desvalorizações do património construído, desta feita ao que tudo indica para reajustamentos em torno das garantias exigíveis às instituições financeiras, em especial as que possuem muitos ativos imobiliários, insistir nessa ideia é multiplicar de forma exponencial a austeridade que se abate sobre as famílias portuguesas. Com toda a publicidade habitual dos arautos do costume e adiando para muito mais tarde a recuperação que todos perseguem e que o país necessita para honrar os seus compromissos e satisfazer as respectivas necessidades colectivas.

O Banco de Portugal “queixa-se” do não esvaziamento de um bolha que diz não ter existido mas aproveita este não acontecimento para deixar pistas suscetíveis de favorecer a desvalorização artificial do património imobiliário parecendo muito mais preocupado em garantir que os ativos imobiliários, na posse das instituições financeiras, não sejam contados em alta do que evitar que, por esta via, as famílias portuguesas outrora aliciadas a adquirir casa própria, vejam a riqueza que foram juntando valer cada vez menos.

Tudo isto numa engenharia financeira que nem ao país, nem provavelmente ao sector financeiro, garante benefícios. Não sendo o país, não sendo o sistema financeiro, não sendo as famílias portuguesas quem ganha com a pretendida desvalorização artificial dos preços das casas, é legítimo perguntar em nome de quem se insiste nestas propostas eufemisticamente classificadas como “correções adicionais dos preços”?

Só aparentemente essa desvalorização poderá interessar a quem promove o encontro entre a oferta e a procura no mercado imobiliário português. Poderá haver, por esta via, algum acréscimo de transações mas as seguintes diminuirão de valor e o valor de todos os imóveis, mesmo aqueles que não estão à venda, cairá automaticamente, consubstanciando-se um silencioso empobrecimento da riqueza das famílias portuguesas.

Luís Lima
Presidente da CIMLOP
Confederação da Construção e do Imobiliário de Língua Oficial Portuguesa
presidente@cimlop.com

Publicado no dia 02 de dezembro de 2013 no Jornal i

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