A Economia paralela, informal, como a de algumas feiras da ladra, pode ser tão respeitável quanto, em algumas circunstâncias, contribua para um necessário equilíbrio da Sociedade, seja na solução de uma parte do desemprego, seja na capacidade que tem de compensar a asfixia que a gula fiscal pode causar em muitos sectores da população.

Logo após o 25 de Abril, dizia-se, nos passos perdidos do Processo Revolucionário Em Curso, vulgo PREC, que os orçamentos das duas principais agências de espionagem subitamente a operarem no terreno – a americaníssima CIA e a sovietíssima KGB – eram tão significativos que, apesar de informais e paralelos, ajudavam a frágil economia portuguesa a aguentar-se.
 
A criatividade do povo brasileiro em matéria de economia paralela é exemplar. E muito do que o Brasil conseguiu nos últimos anos, com a promoção de 30 milhões de brasileiros que deixaram a base da pirâmide social e entraram para esse estatuto, a que chamamos de classe média, só foi possível porque a outra economia, a maldita, aguentou a barra.
 
Vem de longa a nossa tradição das feiras da ladra, onde se compra um chapéu de chuva quase sem pano e sem varetas, um monte de livros e outro de gravuras, de acordo com reportagens antigas que falam das clássicas duas tendas gémeas onde, numa vende-se “uma caixa de folha para chapéu armado” e na outra “um chapéu armado para aquela caixa de folha”.
 
Embora temendo os puristas das teorias económicas, da raça das agências de rating, tão puras e tão limpas que até metem nojo, ouso sublinhar a opinião do Dr. João César das Neves quando ele fala, sem defender a evasão, na asfixia fiscal que atinge as empresas e os contribuintes singulares, com a tendência que o Estado tem de preferir cobrar a quem pode e não consegue fugir mais do que a quem deveria cobrar. Infelizmente, isso vê-se e anuncia-se para o imobiliário.
 
Foi a consciência desta realidade que ajudou ao sucesso do poema de Ary dos Santos, inicialmente cantado por Carlos do Carmo e mais recentemente recriado por Sara Tavares. (…)O que é que eu vou roubar à Feira? //  Um beijo de mulher trigueira. // Aqui um coração, ali uma gravura. // É a Feira da Ladra ternura. (…). Ritmos vitais que, pelos vistos, ultrapassam a compreensão das especialistas das agências de notação financeira.
 
Luís Lima
Presidente da APEMIP
luis.lima@apemip.pt

Publicado no dia 12 de Julho de 2011 no Jornal de Notícias

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