O facto das Finanças poderem lançar leilões electrónicos, com casas que têm uma base de licitação de um euro – repito um euro – , não significa que este valor faça mercado. Nem sequer os cinco mil e poucos euros a que tal imóvel, de Setubal, já chegou ao fim de umas dezenas de licitações, podem ser considerados o preço de mercado.

Generalizar situações perfeitamente atípicas do mercado imobiliário português que, só existem em quadros extremos de proprietários que perderam compulsivamente as respectivas propriedades, pode dar uma imagem muito distorcida da nossa realidade, mesmo que pareça favorável a quem quer vender a qualquer preço.

Falar numa quebra de até 50% do preço dos imóveis como uma vantagem comercial para quem queira vender ao desbarato ao estrangeiro é distorcer a realidade  O imobiliário em Portugal, nomeadamente o que tem vocação para segunda habitação, é uma boa opção pela relação preço/qualidade, não pela hipotética maior desvalorização  de quantas desvalorizações estejam a ocorrer na Europa.

Não estamos a viver num cenário de bolha imobiliária, mesmo que o The Wall Street Journal, dos Estados Unidos, cujos correspondentes em Portugal estão insuficientemente informados, insinue o contrário, quando diz que o valor pedido pelas habitações desceu entre 15 e 50%, e, considera esta desvalorização uma vantagem competitiva.

Claro que é possível encontrar, para servir de exemplo, uma moradia cuja venda chegou a estar anunciada acima dos dois milhões de euros e agora oferece-se por um milhão. Nem esta moradia – que seguramente existe – nem aquele imóvel de Setubal cuja base de licitação no leilão das Finanças foi de um euro, fazem o mercado imobiliário português.

A tentação de transformar o mercado imobiliário num mercado de bens de consumo que acumulam, todos os anos, stocks que se escoam, com maior ou menor facilidade nas épocas de saldos, pode ser aliciante mas não funciona nem – caso funcionasse – serviria o interesse da nossa economia e da maioria das famílias que adquiriram ou estão a pagar casa própria.

Uma desvalorização forçada dos bens imobiliários não se aplicaria apenas aos imóveis que alguns comerciais mais afoitos querem vender a qualquer preço, especialmente baixo. Uma tal desvalorização teria efeitos “retroactivos” e iria empobrecer todas as famílias que optaram pela compra da casa que habitam – 50% de desconto seria uma espécie de meia bancarrota privada.

Luís Lima

 

Presidente da APEMIP

Luis.lima@apemip.pt

 

Publicado no dia 23 de Setembro de 2011 no Jornal de Notícias

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