Há dias, fui transportado para o Rio de Janeiro pela leitura de uma reportagem da jornalista Alexandra Lucas Coelho, publicada numa das revistas do Público, e fiquei preso a um espectáculo, considerado instalação-performance, que dois criadores portugueses, Ana Borralho e João Galante, têm andado a recriar retratando os anseios e as angústias de cada lugar onde actuam.

Estes espectáculos, denominados de Atlas (Atlas do Rio, se acontece no Rio de Janeiro, Atlas de Lisboa, se acontece em Lisboa), contam sempre com a cumplicidade de voluntários locais, que se assumem como participantes activos do próprio espectáculo, testemunhando a sua própria realidade numa obrigatória adaptação à lenga-lenga infantil “se um elefante incomoda muita gente, dois elefantes incomodam muito mais”…

Se, por exemplo, um desses voluntários for um licenciado português que está no desemprego dirá, evocando o número de desempregados na mesma situação, “se 108 mil licenciados que estão no desemprego incomodam muita gente”, frase que servirá de deixa para que todos os demais voluntários participantes respondam, em coro, “108 001 licenciados que estão no desemprego incomodam muito mais”.

É assim que estes Atlas vão sendo desenhados. No Rio de Janeiro, uma das voluntárias referiu-se ao número de “actrizes negras de 40 anos com três empregos”, outro anunciou-se como “um palhaço indignado com as ruas que se transformaram em abrigo de uma infância abandonada e violenta” e um terceiro como “publicitário frustrado porque deste que se formou não consegue actuar na sua área”.

Nós, por cá, em Portugal, podíamos erguer um Atlas bem pessimista e angustiante só com participantes oriundos do sector imobiliário, mas isto é precisamente aquilo que mais temos de combater nestes momentos difíceis. Fosse eu encenador de teatro, levaria a cena um anti Atlas bem luminoso ou um Atlas de cores mais quentes e acolhedoras do que aquelas que alguns agoirentos não se cansam de pintar.

Iria desencantar voluntários dispostos a testemunhar, com verdade e entusiasmo, algo como “se setenta e sete empresários do sector imobiliário que tentam captar investimento estrangeiro para Portugal animam muita Economia”, a que se seguiria a correspondente resposta “setenta e oito empresários do sector imobiliário que tentam captar investimento estrangeiro para Portugal animam muito mais”.

Precisamos urgentemente de uma mobilização nacional para o optimismo, para a vontade de dar uma volta a sério a esta situação que gera Atlas tão deprimentes e precisamos, um dia destes, levar a cena um espectáculo onde se diga “se nove milhões novecentos e noventa e nove mil novecentos e noventa e nove optimistas sobrevivem bem, dez milhões de optimistas sobrevivem muito melhor…

Luís Lima

Presidente da APEMIP e Presidente da CIMLOP

Confederação da Construção e do Imobiliário de Língua Oficial Portuguesa

luis.lima@apemip.pt

Publicado no dia 28 de novembro de 2012 no Público

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