Fico preso nos directos que os vários canais de televisão fazem a Londres, para reportar as revoltas sociais que ali eclodiram há dias, e registo um oportuno comentário de uma jovem jornalista portuguesa, a lembrar que a sociedade em que vivemos, faz um fortíssimo apelo ao consumo, mas não tem conseguido oferecer condições para que os jovens acedam ao mercado de trabalho e consigam obter rendimentos suficientes para satisfazer tal consumo.

Nem tudo se resumirá à frustração de querer, sem poder, fruir o que a sociedade de consumo pretende oferecer, nomeadamente aos mais jovens, mas muita da revolta que por estes dias tem vindo a manifestar-se em Londres e noutras cidades do Reino Unido, assustando residentes e turistas, muita dessa revolta, é um sinal de uma insatisfação legítima que, infelizmente, está a manifestar-se de forma menos legítima ou, como se diz, verdadeiramente, de forma politicamente incorrecta.

Este olhar, para o que verdadeiramente importa preservar numa sociedade democrática, faz-nos reflectir na tentação de ceder a todo e qualquer exagero que tenha consequências no equilíbrio da própria sociedade, um equilíbrio que se obtém no deve e haver entre a vontade de alcançar sempre mais e melhor e a necessidade de sentir alguma segurança e conforto com aquilo que entretanto conseguimos alcançar.

Este cimento das democracias modernas, enraizado na alma e no ânimo da classe média, é o que realmente está a ser posto em causa nas revoltas londrinas, num desmoronar de esperanças e vontades muito favorecido pelos apertos que esta mesma classe média está a sofrer, nestes tempos de austeridade generalizada, uma austeridade – reconheça-se – nem sempre suficientemente explicada aos que sempre mais a sofrem.

A enorme pressão social que se exerce sobre muitas populações europeias, algumas das quais habituadas, desde o fim da guerra, a viver melhor em cada ano que passa, num modelo de sociedade que a si próprio se elogia como a menos má de todas (para usar uma velha expressão de Churchill), está a provocar a abertura de múltiplas válvulas de segurança, nem sempre tão controláveis como se desejaria e como seria bom para quase todos.

Alguns poderão beneficiar da imitação de caos a que nos foi dado assistir em Londres, mas a esmagadora maioria perde. Esta é, sem dúvida, uma lição, a principal lição dirigida principalmente aos que possam julgar ser possível apertar o cinto até ao último furo.

Luís Lima
Presidente da APEMIP
luis.lima@apemip.pt
 

Publicado no dia 19 de Agosto de 2011 no Sol

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