Não há milagres para a redução das dívidas, sejam elas públicas sejam elas particulares, mas, o que é claro (e nem precisava da recente confirmação do FMI) é que a consolidação das contas que derraparam é, historicamente, sempre demorada, exigindo austeridade mas também crescimento. Esta é que é a dificuldade política do tempo presente.
A dificuldade de sempre, como sempre sublinho, ou seja, citando pensadores políticos, a dificuldade em encontrar a lucidez na apreciação daquilo que se pode ou não sacrificar, tarefa que, em boa verdade, faz a diferença nas opções politicas que, a cada momento, desejamos eleger como as melhores para superar as dificuldades existentes.
E é claro para todos nós, neste tempo de aperto, que a riqueza acumulada em Portugal, por muitos portugueses, no património construído, esta riqueza não pode nem deve ser sacrificada. Foi para a erguer, para chegar à riqueza de ter casa que muitas gerações de portugueses emigraram, em diversas épocas e em vários ciclos, para o Brasil, para as Américas, para a França, para a Alemanha…
Neste cantinho da Europa, onde o desenvolvimento que se seguiu ao final da II Guerra Mundial só chegou 30 anos mais tarde, este atraso de décadas, tolerado pela própria Europa e pelo Mundo mesmo quando votavam Portugal ao isolamento, este atraso também explica a vontade de recuperar tempo em benefícios do desenvolvimento e do consumo perdidos, vontade que se manifestou de forma imperiosa quando, com a Democracia, também chegou a Economia de Mercado, quase sem restrições.
Alguma dívida pública acumulada também encontra justificação na urgência que Portugal sentiu em promover obra pública que escasseava, nomeadamente no plano das infraestruturas de que são exemplos mais gritantes o saneamento básico e o abastecimento de água. Às vezes esquecemos que uma praia só pode ter bandeira azul se não houver descargas poluentes no mar…
Um artigo, curiosamente intitulado “O Bom, o Mau e o Feio”, que especialistas do FMI elaboraram para acompanhar as previsões macroeconómicas de Outubro do próprio Fundo Monetário Internacional está a ser profusamente citado nos países mais aflitos, em parte por nele se ler que a redução da dívida pública implica austeridade mas deve ser «complementada por medidas para o crescimento». São especialistas do FMI quem o confirma.
Portugal, que pertence a um clube de países, entre os quais o Reino Unido e a Itália, que, nos últimos cem anos, tiveram momentos em que a dívida ultrapassou os 100% do Produto Interno Bruto (PIB) não está, por esta circunstância negativa, inevitavelmente condenado à falência e ao insucesso. Especialmente se resistir à tentação da desistência geral e da opção de soluções que parecem mais fáceis.
Num dos sectores que conheço bem, o sector imobiliário, é preciso proteger e manter viva esta chama da esperança na convicção de que o mercado imobiliário português pode e deve continuar a contribuir para a recuperação da nossa Economia, por ter, reconhecidamente, espaço significativo de crescimento. Esta tem sido, aliás, a minha insistente mensagem na continuada reflexão pública sobre o sector.
Uma reflexão que – espero – possa influenciar mais e ter mais eco do que a pregação de Santo António, tantas vezes ignorada que este santo padroeiro de Lisboa, um dia, preferiu pregar um sermão aos peixes.
Luís Lima
Presidente da APEMIP
luis.lima@apemip.pt
Publicado no dia 03 de outubro de 2012 no Público