As novas exigências da Autoridade Tributária em matéria de emissão de recibos para os contratos de arrendamento urbano, agora quase todos coercivamente electrónicos, tal como o registo dos novos contratos de arrendamento urbano nas finanças, podem ter efeitos colaterais perversos sem garantir os ganhos de eficácia à cobrança que supostamente perseguem.

Uma das consequências mais evidentes é a machadada que esta nova legislação dá na gestão dos arrendamentos urbanos por parte de empresas de mediação imobiliária. A partir de agora, para que este serviço possa continuar a ser feito, os proprietários terão de autorizar os gestores a emitir recibos, situação que em muitos casos terá de passar pela improvável cedência do login e password dos proprietários aos respectivos gestores.

A gestão profissional dos arrendamentos urbanos – uma via de incentivo ao funcionamento do mercado de arrendamento urbano que tem um peso já significativo no mercado imobiliário português – terá de passar a implicar a autorização de emissão de recibos electrónicos e das guias para pagamento de imposto de selo dos novos contratos de arrendamento, a conceder pelos proprietários aos gestores a quem entregaram o negócio.

Dando de barato as questões relacionadas com a iliteracia informática – estatisticamente decretada pela Autoridade como existente, na população portuguesa,  a partir dos 65 anos de idade – o novo esquema de obrigação declarativa das rendas, para funcionar sem por em causa legítimas gestões profissionais deste mercado alarga a terceiros o conhecimento  dos dados fiscais dos senhorios.

A nossa Autoridade Tributária tanto é capaz, pelo que tem vindo a ser tornado público, de zelos rigorosamente vigiados na defesa da privacidade fiscal de certos contribuintes como parece disposta a condenar outros contribuintes a uma exposição fiscal quase tão escancarada quanto a exposição dos pobres concorrentes a concursos tipo Big Brother ou Casa dos Segredos.

Esta nova legislação poderá ser – admite-se – o caminho mais fácil para que a Autoridade Tributária garanta um controlo férreo sobre os proprietários de imóveis, mas está longe de ser o caminho mais equilibrado e justo para alcançar este objectivo desde logo pela abrupta filosofia que impõe, num arremedo ao estilo policial do fisco norte-americano, cuja polícia é mais temida do que outros corpos policiais.

Em 2014, segundo declarações então prestadas publicamente à Imprensa pelo secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, o fisco detectou 20 mil rendas por declarar no ano anterior, pelo simples cruzamento de informação oficialmente disponível capaz de detectar arrendamentos clandestinos através de indícios que as próprias autoridades revelam como é o exemplo – sempre citado – das investigações devidas quando alguém declarar morada fiscal num imóvel que não lhe pertence.

Pelos vistos estas acções para combater a fraude são ainda insuficientes ao ponto de se impor uma vigilância tão apertada quanto desfasada dos nossos hábitos, onde essa ideia de que estamos sempre e ininterruptamente sob vigilância electrónica não soa bem. Também desde logo quando, nesta matéria, parece que uns são vigiados para serem protegidos e outros nem por isso. À americana.

Luís Lima
Presidente da CIMLOP
Confederação da Construção e do Imobiliário de Língua Oficial Portuguesa
presidente@cimlop.com

Publicado no dia 30 de Abril de 2015 no SOL

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