O Fisco, com éfe de Finanças, não pode continuar a mostrar-se como o “grande cão”, celebrizado numa gravura que Rafael Bordalo Pinheiro publicou no jornal “A Paródia” caricaturando a voracidade deste braço do Estado no rescaldo da crise financeira de 1891, um momento da nossa vida coletiva também marcado por uma grave estagnação da criação de riqueza.
Aos olhos da população portuguesa da época, que era maioritariamente rural e analfabeta, o fisco aparecia com essa feroz imagem, tão agressiva quanto imprevisível, retrato que, infelizmente, continua a ser o mesmo, mais de um século passado apesar da profunda evolução que a sociedade portuguesa sofreu em muitas outras áreas.
Justificava-se, há muito, uma mudança de mentalidades que, por exemplo, invertesse a opinião, ainda muito positiva, que vamos dando a quem consegue fugir ao fisco, como se encarnasse a alma de Robin dos Bosques que desafiava o Xerife de Nottingham, usurário cobrador de impostos, para beneficiar os pobres.
Os tempos são outros – ou deviam ser – embora a Direção Geral de Impostos de hoje tenha comportamentos relativamente aos contribuintes que muito se aproximam das prepotências do Xerife de Nottingham, mas agora sem a coragem de darem a cara por esses atropelos como, apesar de tudo o Xerife de Nottingham dava.
Esta é a imagem que o fisco de hoje dá quando, fingindo compreender a situação de emergência que o tecido empresarial vive, aceita a regularização faseada de dívidas em atraso mas pode, sem qualquer aviso prévio, cativar contas bancárias mesmo que as prestações acordadas estejam a ser pagar com a regularidade do acordo.
Ao negar assim, e de forma tão imprevisível como acontecia no condado de Nottinghamshire no tempo de Robin dos Bosques, as realistas condições de pagamento negociadas com quem deve, quer pagar e não é devedor de má-fé, o fisco, mesmo sendo um pilar do Estado Social, revela uma clara insensibilidade social que nem no sector privado já encontramos.
Afinal a imagem que o povo português tinha do Fisco no tempo em que Rafael Bordalo Pinheiro o caricaturava no jornal “A Paródia” não mudou muito. O que não tem graça alguma.
Luís Lima
Presidente da CIMLOP
Confederação da Construção e do Imobiliário de Língua Oficial Portuguesa
presidente@cimlop.com
Publicado no dia 28 de julho de 2014 no Diário Económico