Imagine o leitor que tinha de celebrar a Passagem de Ano só com oito uvas passas. Diria, no mínimo, que a tradição já não é o que era e queixar-se-ia amargamente da festa, não lhe concedendo qualquer benefício de dúvida. Também recusaria augurar algo de bom para o novo ano perante esse exemplo de penúria.

A quebra do turismo no Algarve nesta mini época alta que sempre foi a Passagem de Ano poderá ter sido bem maior do que aquela imaginária quebra de doze para oito uvas passas, se contabilizarmos o elevado número de hotéis que encerraram pela primeira vez nesta altura do ano e projectarmos as promoções com que tentaram disfarçar a crise.

A mini época alta do fim-de-ano no Algarve tem, como se sabe, um público alvo muito centrado no mercado interno e no mercado espanhol, ambos a viver constrangimentos económicos que ajudam muito pouco à multiplicação das uvas passas, para continuar a utilizar este doce exemplo.

O Turismo, nomeadamente o Turismo Algarvio, carece, como sublinho muitas vezes em sintonia com gente que conhece bem esta realidade, de novos públicos alvo e de se reinventar para os públicos tradicionais, especialmente quando o objetivo é manter viva e em alta uma época alta como a do Fim-de-Ano, mesmo que seja de curta duração.

No Verão passado, olhando para um Algarve que ainda registava uma razoável ocupação turística sublinhava a anunciada queda do poder de compra da procura interna e também a evidência de alguns mercados externos tradicionais em quebra não estarem a ser substituídos por outros mercados externos menos óbvios.

O Algarve, que sempre balançou entre a tentação de um turismo de massas, em parte influenciado pelo turismo do Sul de Espanha, e um turismo mais selecionado, de qualidade, de menos procura mas não menos retorno, talvez deva repensar a imagem de destino turístico generalista que foi consolidando no último meio século.

Embora Albufeira já fosse a banhos nos finais do século XIX, como bem descreve Eça de Queiroz, é bom lembrar que, à época, as senhoras de bem e de bens contentavam-se em dar um passeio à tardinha, à beira mar, para apanhar conchinhas, oferta que é hoje manifestamente insuficiente em termos turísticos.

Hoje o turismo já não pode ser uma mediania dourada, apaixonada por gostos provincianos e com vontade de fugir à modernidade das cidades. Hoje o turismo exige isto mas também cosmopolitismo, bons campos de golfe, lojas de marca e uma oferta diversificada e de impacto no domínio da diversão e das produções culturais. 

Talvez o Algarve precise de uma Casa da Música, como a do Porto, ou de um Museu Berardo como o que está instalado no Centro Cultural de Belém, tanto ou mesmo mais do que o tecido empresarial de pequenos bares que transmitem em direto os jogos de futebol da primeira liga inglesa.

Não sei, mas sei que precisa de mudar para que não tenhamos, nalguma passagem de ano, de nos contentarmos com oito uvas passas.

Luís Lima

Presidente da APEMIP e da CIMLOP

Confederação da Construção e do Imobiliário de Língua Oficial Portuguesa

Luis.lima@apemip.pt

Publicado no dia 09 de janeiro de 2013 no Público

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