A Europa desenvolvida, a Europa que detinha a melhor oferta do planeta em bem-estar social, parece estar a tremer com um descontrolo generalizado das contas públicas. Muitos Estados europeus precisaram de mais dinheiro do que recolhido em impostos e tiveram de ir aos mercados para angariar financiamentos.

As regras que a própria Europa tinha definido nesta matéria pelo Tratado de Maastricht (1992) eram claras no sentido de limitar a 60% do PIB o montante máximo das dívidas a contrair pelos Estados, valor que, em muitos casos foi ultrapassado, até para mais do dobro, o que gerou a desconfiança na capacidade europeia de honrar as dívidas contraídas.

A juntar a este cenário de enorme fragilidade é bom recordar a bolha imobiliária que se formou nos Estados Unidos da América, uma bolha visível desde 2007 que exportou para a banca norte-americana e europeia activos de elevado risco, sustentados por hipotecas de baixa ou nula segurança. O resultado foi visível na banca com a necessidade de se proceder à injecção de liquidez com dinheiros públicos.

Em consequência – e como gato escaldado de água fria tem medo – a própria banca, outrora generosa, até mesmo imprudente, no abrir dos cordões da bolsa, está claramente a retrair-se e a dificultar o financiamento da Economia num excesso de prudência tão prejudicial como a imprudência de outros tempos, pois sem esse financiamento não haverá o indispensável crescimento.

Num círculo vicioso de estagnação que gera recessão e faz diminuir receitas fiscais, a tentação de se optar por mais austeridade sobre a austeridade já imposta é grande apesar de se saber que neste cenário a recessão aumentará e com ela a diminuição do poder de compra dos europeus, que formam um dos maiores mercados consumidores do mundo, com consequências em toda a Economia global.

A ideia de globalização é fundamental neste contexto. A globalização é uma realidade mas a globalização implica, cada vez mais, preocupações de justiça e de sustentabilidade. Pensar, como ainda há quem pense, que neste Mundo global é possível encontrar quem produza o mesmo, a preços ainda mais esmagados não é contribuir para ultrapassar a crise.

A primeira mudança de paradigma neste contexto diz-nos que a frase paradigmática das nossas sociedades já não é mais a que o presidente Kennedy proferiu no Congresso dos Estados Unidos da América, a 15 de Março de 1962 quando disse que “consumidores somos todos nós”. Temos, todos nós, de voltarmos a ser, prioritariamente, cidadãos se quisermos salvar a nossa Economia ainda baseada no consumo do que conseguimos criar e oferecer.

E no quadro de uma cidadania alargada à esmagadora maioria da população, o problema do emprego e do combate ao aumento prolongado do desemprego com o consequente alastramento da pobreza é uma das respostas essenciais para combater a crise. O desaparecimento de empresas e de postos de trabalho tem de ser estancado, o que exige mais determinação nesta área. Todos temos de investir muito mais no debate destas questões.

Luís Lima

Presidente da APEMIP

luis.lima@apemip.pt

Publicado no dia 05 de março de 2012 no Jornal i

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