“Crédito à habitação cresceu quatro vezes em cinco anos”, foi o título de uma notícia veiculada durante o fim de semana, que poderá induzir em erro os mais desatentos, e levá-los a pensar que as famílias portuguesas não aprenderam nada com o passado recente e que estão, uma vez mais, a sobre endividar-se para comprar casa.

Mas, como em tudo é preciso ler nas entrelinhas e perceber que este crescimento não é assim tão abismal quanto isso, se tivermos em conta que há cinco anos atrás o nosso País atravessava um momento atípico em que as dificuldades eram tão evidentes que levaram à necessidade de intervenção externa, via Troika (Fundo Monetário Internacional, Banco Central Europeu e Comissão Europeia).

Estamos por isso a comparar o ano de 2017, um dos melhores desde que há registos oficiais no que diz respeito à transação de alojamentos familiares, com o ano de 2012, em que Portugal estava no pico da crise económica.

Não é de admirar que, cinco anos depois, o crédito à habitação tenha crescido, sobretudo tendo em conta o dinamismo que o sector imobiliário tem vivido no nosso País, apoiado no investimento estrangeiro e na melhoria do mercado interno, que foi também estimulado pela retoma económica e pela melhoria das condições de vida das famílias e da sua situação laboral.

Como referi ontem, na oitava sessão Fora da Caixa, promovida pela Caixa Geral de Depósitos sobre o tema “A relevância da Mediação Imobiliária no Mercado Atual”, é preciso que se desmistifique a ideia de que os Portugueses estão a endividar-se para comprar casa, e de que isso poderá ser um alerta de perigo.

A realidade de hoje não é a mesma de há uma década, e o sector financeiro tem critérios muito mais apertados na concessão de crédito do que tinha nos anos pré-crise, protegendo não só os bancos, mas também as próprias famílias, do risco de incumprimento.

Também o Banco de Portugal está mais atento, tendo aliás feito recomendações que vão no sentido de haver uma maior restrição na concessão de crédito à habitação, que só podem ser vistas como uma antecipação do regulador para prevenir eventuais excessos que, de momento, ainda não existem, como podemos comprovar se compararmos o valor do crédito concedido em 2007 (19.630 milhões) com o os 8.261 milhões registados no ano passado. Dez anos depois, os bancos emprestaram menos de metade do valor às famílias portuguesas.

Hoje, o mercado imobiliário português está muito mais diversificado, e tem características muito diferentes das que tinha nos anos em que dependia intimamente do crédito. Há cada vez mais investimento feito em recurso a empréstimo bancário, quer por famílias que decidiram investir as suas poupanças num mercado seguro e rentável como é o imobiliário, quer pelos investidores estrangeiros que, na sua grande maioria, não recorrem a crédito à habitação.

Por outro lado, quem compra casa com recurso a empréstimo, não tem as mesmas facilidades que tinha antigamente, uma vez que os bancos já não emprestam a 100%, obrigando os compradores a adiantarem, pelo menos, 20 a 30% do valor total do imóvel.

Esta diversificação do mercado é muito benéfica e faz com que a possibilidade de haver uma bolha imobiliária seja ainda mais diminuta.

Não há crédito à habitação a mais. Neste momento, o problema é que há casas a menos, e os alertas devem dirigir-se para a necessidade de regressar à construção nova.

Luís Lima

Presidente da APEMIP

luislima@apemip.pt

Publicado no dia 14 de março no Jornal Público

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