Metade dos portugueses desempregados estão desempregados há mais de um ano. São números oficiais do Instituto Nacional de Estatística (INE) e são números que correspondem a níveis históricos. Este é o cenário do chamado desemprego de longa duração, menos grave do que o desemprego de muito longa duração, ou seja, o dos portugueses que estão há mais de dois anos sem emprego. Esta situação atingia, no início do presente ano, 228 mil pessoas, número que ainda é muito elevado mas que, no entanto estará a descer.
Os números do desemprego em Portugal são preocupantemente elevados e tocam diretamente em quase um milhão de portugueses, seis zeros à direita do algarismo 1 e outros tantos rostos de outras tantas vidas, dependentes de outras vidas ou com outras vidas deles dependentes. A dimensão do problema é mais perceptível se identificarmos alguns desses rostos em vez de os deixarmos anónimos na imensa multidão do elevado número que o INE divulga.
Quando falamos num desempregado, no abstracto, até corremos o risco de ouvirmos gente dizer, sem rigor e com ainda menos sensibilidade, que haverá muitos portugueses que estarão nessa circunstância por vontade própria, opinião que carece de prova. Mas se nomearmos algum desempregado, identificando-o pelo próprio nome, revelando a sua idade e mostrando os medos que a situação do desemprego lhe provocam, esta realidade, que também atinge quem tem trabalho, torna-se muito mais pesada.
Há dias, lendo uma reportagem sobre a destruição do emprego, fiquei preso ao testemunho de um homem de 57 anos, canalizador de profissão, desempregado há quase dois anos, na sequência da falência de uma empresa onde trabalhou 30 anos. Confessa-se envergonhado por não ter emprego e por andar a pedir trabalho que não encontra, admitindo ter medo de não conseguir voltar a trabalhar, com todas as consequências dessa situação.
Neste testemunho, com rosto, de um desempregado português, impressiona a preocupação revelada na vontade de honrar o compromisso assumido com um crédito obtido para comprar habitação própria. Diz, a propósito, que não salvou o emprego mas quer salvar a casa, apesar de se adivinhar que não é responsável pela situação de desemprego em que se encontra. Também diz que “cansa muito não ter emprego”, expressão que traduz o mundo assustador da ausência forçada de trabalho, numa sociedade, como a nossa, que precisa, urgentemente, de crescer e gerar mais riqueza, objectivo que só se alcança com trabalho.
Este olhar mais próximo sobre estes aspectos da realidade de Portugal, neste contexto difícil, também deve merecer a atenção daquelas ciências mais exatas como serão as ciências económicas. É que, importa não perder nunca a ideia que não haverá mercado, sociedade ou nação soberana que resistam sem gente e sem gente minimamente realizada e feliz.
Luís Lima
presidente da APEMIP
luis.lima@apemip.pt
Publicado no dia 23 de maio de 2012 no Público