Por um raro circunstancialismo, uma das notícias mais significativas das leituras do último fim-de-semana de Julho saltou literalmente para a minha atenção num momento em que, aos meus olhos, só metade do respectivo título era visível – “liquidar crédito à habitação”.

A primeira linha do título é indispensável a uma primeira compreensão, rápida e sintética da notícia, mas quando os meus olhos pousaram na página, estava literalmente tapada por um dos suplementos do jornal em causa, tendo essa linha (“BCP faz desconto a quem”) sido lida mais tarde.

Percebi, então, que o que estava em causa não era a liquidação do crédito à habitação mas apenas uma estratégia do banco para conseguir recuperar mais rapidamente capital com eventuais ganhos para alguns clientes. Mas com aquele circunstancialismo, não ganhei para o susto.

Esta minha leitura – reconheça-se – não é tão circunstancial nem tão enviesada como poderá parecer à primeira vista, pois, pensando melhor, até custa a acreditar que os bancos (e não apenas o banco que referi) queiram livrar-se dos clientes que, historicamente, têm sido mais fieis e mais certinhos.

Pode até parecer, numa observação mais precipitada, que a tentação de passar uma esponja por essa área de negócios do crédito à habitação, tão acarinhada em tempos não muito distantes por todos os bancos, esteja a ganhar terreno, como uma mancha pecaminosa que alastra.

Ainda está bem viva na memória de muitos de nós, incluindo consumidores, a acirradíssima disputa das instituições financeiras pelos potencias interessados na aquisição de casa própria, um disputado assédio que quase só encontra paralelo nos actuais operadores de internet e televisão por cabo.

Esta comparação pode ser excessiva, reconheço. Não estou a ver qualquer das operadoras de internet e/ou de televisão por cabo a lançar uma campanha para eliminar clientes com ofertas de descontos, nas mensalidades do período de fidelidade que ainda não estejam vencidas.

Ironia à parte, e voltando as atenções para a iniciativa do BCP relativamente aos clientes do crédito à habitação, tenho de confessar que a ideia não parece tão sedutora como se apresenta numa segunda leitura daquele título a cinco colunas que provocou esta reflexão.

O que é normal, o que é suposto ser normal, é que as instituições financeiras concedam, com as adequadas cautelas de quem financia, crédito a quem dele precisa e quer, para que nem por piada se diga que banco é aquele prestamista que empresta dinheiro a quem lhe provar que não precisa do empréstimo.

Luís Lima
Presidente da APEMIP
luis.lima@apemip.pt

Publicado no dia 12 de Agosto de 2011 no Sol

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