O documento da Nova Geração de Políticas de Habitação é uma orientação estratégica para o Governo, que tem como prioridade política garantir a todos o direito à habitação adequada em Portugal.

Este documento, que prevê, entre outros instrumentos, um conjunto de medidas de alteração do enquadramento fiscal do mercado de arrendamento, tem o intuito de fazer deste mercado uma verdadeira alternativa habitacional, o que até então não se tem verificado.

Os problemas do mercado de arrendamento (que já têm décadas) acentuam-se agora com o mercado imobiliário em total ebulição. Depois da estagnação a que se viu votado no período de crise económica que abalou Portugal, esses dias negros estão cada vez mais distantes e por vezes parecem até estar esquecidos. A retoma fez-se de tal modo que hoje é o próprio mercado a exigir mais stock imobiliário, quer para o mercado de compra e venda, quer para o mercado de arrendamento (em particular, nos grandes centros urbanos),para que se possa dar uma resposta adequada às necessidades da procura existente.

E, como sabemos, a falta de ativos no mercado, faz com que os preços praticados subam, estando, neste momento acima do que seria desejável e das possibilidades da grande maioria das famílias portuguesas, dificultando o acesso à habitação.

Por isto, este documento apresentado pelo Governo promove alterações legislativas em matéria de arrendamento urbano, onde se encontram medidas cujo objetivo seria o de resolver as situações de desequilíbrio entre os direitos de senhorios e inquilinos.  

No entanto, esta proposta veio reabrir o ringue de boxe onde se trava a luta entre as duas partes, uma luta clássica que não se prevê quando possa ter fim, de onde nunca sairá nenhum vencedor, mas apenas perdedores, que são  os portugueses que procuram e precisam de uma casa para viver.

No contexto que vivemos, o centro do debate não pode voltar as ser a corda que é puxada por proprietários, de um lado, e por inquilinos, do outro, mas sim as medidas que poderão trazer algum equilíbrio a um mercado que não está a conseguir dar resposta à garantia do acesso à habitação.

O mercado de arrendamento não pode nem deve ser um cenário de luta de classes, e todas as partes devem trabalhar no sentido de fazer com que este mercado funcione adequadamente. O que está verdadeiramente em causa é a verdadeira dinamização do mercado de arrendamento, através de medidas que passam por incentivos fiscais a quem promova uma oferta a preços acessíveis, ou por dar ao Estado o direito de requisitar temporariamente (e mediante indeminização) habitações devolutas, o que faz todo sentido num período de escassez de oferta e de urgência habitacional.

Não se justifica que nos tempos que correm continue a existir património devoluto, em autêntica degradação, quando poderia ser reabilitado e colocado no mercado, ao serviço dos cidadãos e das suas necessidades.

Estas outras questões, importantes sem dúvida, pertencem ao debate sobre as funções sociais do Estado que, num Estado de Direito como o nosso não podem ser transferidas para os proprietários de imóveis, neste direito que é o do acesso à habitação.

Nos últimos anos tentámos caminhar no sentido de promover equilíbrios. Mantenhamos este caminho, e evitemos o regresso ao passado centrando o debate em interesses que não promovem de forma alguma o bem comum.

 

Luís Lima

Presidente da APEMIP

luislima@apemip.pt

 





 

Publicado no dia 23 de maio no Jornal Público

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