Amaya Egaña, casada, 53 anos, mãe de um jovem de 21, residente na cidade vasca de Barakaldo, onde já exercera cargos políticos autárquicos, suicidou-se há dias atirando-se para a rua da janela de um apartamento situado num quarto andar, momentos antes da entrada de oficiais de Justiça que se preparavam para executar uma ação de despejo por incumprimento das prestações devidas ao banco que financiou a aquisição da habitação.

Este ato, cujas verdadeiras motivações jamais conheceremos com rigor, tem, queiramos ou não, profundas consequências políticas, de diversificadas leituras, e deve implicar uma reflexão aprofundada, não apenas confinada à realidade que se vive no Estado Espanhol mas alargada a outros países da União Europeia que suportam uma crise de dimensões gravíssimas.

E a primeira ilação – muito mais adequada, quase poderia dizer, justa, do que a fácil e precipitada tentação de culpar a banca – é a de sublinhar que a crise que atravessa os países da Zona Euro está a castigar de forma particularmente dura a classe média, numa violência agravada pela natural e compreensível opção das vítimas em esconder a situação até ao limite do impossível. 

Em Espanha, na sequência da emoção gerada pelo suicídio de Amaya Egaña, o segundo em quinze dias por razões idênticas, a banca passou a aceitar moratórias de dois anos nos casos extremos dos incumprimentos dos particulares em sede de crédito à habitação. Entre nós, esta sensibilidade, que é também um ato de inteligência, já vem sendo assumida pela banca há algum tempo e contempla renegociações das dívidas e dos spreads, alargamentos de prazos a par de outras soluções.

Tudo o que possa evitar rupturas que possam desencadear, em cadeia, outras rupturas, num crescendo que ameace ficar fora de controlo é, naturalmente positivo, mas o que é realmente importante, neste contexto, que é o da Espanha mas é também o de Portugal e de outros países da União Europeia, é não ficar pelas manifestações mais epidérmicas e visíveis e antever situações que podem ser mais desgastantes e graves do que não poder pagar a tempo a prestação da casa.

Quando os Estados aumentam as cargas fiscais em várias frentes, diretas e indiretas, forçam a diminuição dos rendimentos de quem trabalha e diminuem significativamente as prestações sociais (no desemprego, na doença, na educação), aos cidadãos da classe média não vai bastar as moratórias dos bancos para não entrarem em incumprimento. Muitos vão deixar de poder pagar impostos e, quanto a isto, parece que não há qualquer tolerância. Nestes cenários, atingir o ponto de não retorno é um risco real.

O que importa, mais uma vez e com carácter de urgência, é regressar ao crescimento económico, antes que seja tarde.

Luís Lima

Presidente da APEMIP e Presidente da CIMLOP

Confederação da Construção e do Imobiliário de Língua Oficial Portuguesa luis.lima@apemip.pt

Publicado no dia 21 de novembro de 2012 no Público

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