Nós por cá, que há mais de 500 anos andamos a viajar para o Brasil, olhamos com pouca atenção para esse enorme país que julgamos conhecer mas que na verdade tanto desconhecemos – quantos de nós saberão que foi em 1822 que o país recuperou a independência, que foi em 1889 que passou a ser uma República e foi em 1985 que recuperou a Democracia após 21 anos de ditadura militar?
Talvez nos lembremos que há 40 anos, mais mês menos mês, Francisco Buarque de Hollanda, mais conhecido por Chico Buarque, um dos grandes intelectuais da lusofonia que há dias celebrou setenta anos de idade, escreveu, em plena ditadura militar brasileira, uma canção de homenagem ao regresso da Democracia a Portugal, a que deu o nome de Fado Tropical e onde vaticinava um futuro mais próspero para o Brasil.
Ele, que pôs o Amazonas a correr por Trás-os-Montes e a desaguar no Tejo, vaticinando igualmente que a terra do Brasil iria “cumprir seu ideal” e “tornar-se um imenso Portugal” , estaria então então ainda longe de pensar que uma inflação tão brutal e atípica, que se notava da manhã para a tarde, poderia ser controlada, e que o país poderia transformar-se numa Economia emergente, com crescimento e desenvolvimento em conformidade.
Sabe-se hoje que um dos segredos deste salto qualitativo do Brasil também passou pela promoção de milhões de brasileiros que deixaram a base da pirâmide social para integrarem a classe média e, principalmente a Economia formal, a par de outros desafios assumidos pelo Estado, como por exemplo a criação de um sistema público de saúde universal, ainda em desenvolvimento, um caso único e exemplar, em países com mais de cem milhões de habitantes.
Hoje o Brasil é muito mais do que o país que acolhe o Campeonato Mundial de Futebol 2014 ou vai receber, no Rio de Janeiro, dentro de dois anos, os Jogos Olímpicos de 2016. É um país que aposta num ciclo de crescimento que mantenha a solidez económica e aumente as prestações e os apoios das políticas sociais, baseando-se assumidamente na sociedade do conhecimento e numa educação de qualidade.
Tudo isto só é possível, como múltiplas experiências políticas em todo o Mundo o demonstram, se um dos pilares destas transformações for a classe média, a procura e o mercado privilegiado das cidades, os espaços que no Brasil, como em muitos outros locais, estão a merecer profundas reformas ditas urbanas, com vista à qualidade de vida, no plano dos transportes, da mobilidade, da habitação.
É precisamente o contrário do que temos vindo a fazer por cá. Sobrecarregando toda a base da pirâmide social e uma parte muito significativa da classe média, com impostos excessivos, com perda de apoios sociais e sem políticas de emprego que invertam de forma clara e significativa as fortes taxas de desemprego que se verificam e alimentam um pesadelo permanente.
As quedas na pirâmide social a atingir pessoas que se julgavam e julgávamos seguras no patamar em que se encontravam têm de ser estancadas não só em nome das preocupações sociais que qualquer Estado deve assumir mas também em nome da nossa própria recuperação económica.
Luís Lima
Presidente da CIMLOP
Confederação da Construção e do Imobiliário de Língua Oficial Portuguesa
presidente@cimlop.com
Publicado no dia 25 de junho de 2014 no Público