O empobrecimento compulsivo da chamada classe média, em países como Portugal, num fenómeno que também pode ser classificado como a proletarização dessa mesma classe média, deverá preocupar-nos pois pode por em causa o nosso próprio sistema socioeconómico.

Num quadro de austeridade como o que a Europa vive, o enfraquecimento desses esteios dos Estados Sociais e das Democracias pode ser fatal até para os próprios Estados Sociais e para as Democracias, como aliás podemos ler num ensaio sobre a matéria do sociólogo Elísio Estanque.

Sob o título “Classe Média: Ascensão e Declínio”, a obra, já assinalada em edição anterior e noutro espaço deste semanário, levanta questões pertinentes para o nosso próprio futuro e ajuda a compreender reações cuja dimensão real tem de ser apreendida se quisermos, realmente, contribuir para uma mudança no sentido positivo do termo.

Em momentos de transição, quando as sociedades são obrigadas a escolher um entre vários caminhos possíveis, importa refletir seriamente sobre todas as possibilidades e isso requer um olhar frio e distanciado que tenha em conta as pessoas reais, olhar que só estudos rigorosos e fundamentados podem proporcionar.

Construída tardiamente e à pressa, a classe média portuguesa cresceu, ganhando hábitos que, em boa verdade, talvez não tivesse condições para adquirir, mas que, adquiridos, só podem ser emendados paulatinamente, como quem se desintoxica com os cuidados necessários para que a desintoxicação não seja fatal.

Cruza-se neste estudo, publicado em livro em linguagem inclusiva, vários olhares sobre a chamada “classe média assalariada” que, entre nós integra muitas gerações jovens de universitários sem grandes perspetivas no plano da respetiva realização profissional.

Estes que engrossam todos os dias o exército dos desempregados, quando, formados e disponíveis, não conseguem o primeiro emprego, acentuam o pessimismo e a falta de esperança que são rastilhos para uma perigosa implosão de uma classe que é o cimento da sociedade que fomos construindo e cujos méritos procuramos.

Como dizia nestas mesmas páginas o próprio sociólogo Elísio Estanque, citado a propósito do livro sobre a Classe Média que acabou de publicar, “estamos num momento de encruzilhada de viragem (…) Estamos num Mundo conturbado, estamos num momento de transição. Para o bem ou para o mal”.

Não posso, por isto, deixar de estar mais de acordo com ele quando ele diz que o futuro da classe média deveria preocupar-nos muito mais do que este presente de protestos dessa mesma classe média. Protestos que são, aliás, uma chamada de atenção a que não podemos virar costas.

Luís Lima
Presidente da APEMIP
luis.lima@apemip.pt

Publicado no dia 17 de Fevereiro de 2012 no Sol

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