Mais uma vez os números que o sector tem vindo a adiantar são validados oficialmente pelo Instituto Nacional de Estatística (INE) e pelo Banco de Portugal. Para valores de 2013, a compra de casa é o principal motivo de endividamento dos portugueses e há perto de 75% das famílias a serem proprietárias do imóvel onde vivem, sendo que um terço destas está ainda a pagar um crédito à habitação e deu os próprios imóveis como garantia dos financiamentos bancários. 

A residência principal é, para a maioria das famílias proprietárias de casa própria, o principal ativo real, na leitura de um recente inquérito à situação financeira das famílias. Por outro lado, em média a riqueza familiar líquida cifra-se em pouco mais de 70 mil euros, sendo os depósitos a prazo o principal ativo financeiro. Um perfil conservador que está, digo eu sem me referir ao estudo, a dar lugar à canalização de muitas poupanças para o investimento imobiliário.

O sonho de ter casa é, sempre o disse e sempre todos quantos actuam neste sector o sabem, a grande bandeira das famílias portuguesas. Há meia dúzia de anos, também um estudo coordenado pelo Centro de Estudos Territoriais do Instituto Superior de Ciências do Trabalho e da Empresa (CET/ISCTE), com o apoio da Fundação Calouste Gulbenkian, revelava que a maioria dos portugueses tinha uma apreciação muito positiva da casa e do lugar onde viviam.

Valores que refletiam os efeitos das décadas de 80 e 90 do século passado, anos correspondentes à explosão da construção e à corrida à aquisição de casa própria que marcou o nosso passado mais recente, na consolidação de uma classe média emergente e no aparecimento, entre nós, de profissões novas e de novos hábitos de consumo, bem como de uma maior exigência em material de qualidade de vida.

Habitar melhor foi, em primeiro lugar, ter mais espaço, mais conforto (que advem da melhoria do estado da arte de construir em matéria de insonorização, de fiabilidade e durabilidade dos materiais e de eficiência energética) e poder viver numa área de residência vocacionada para área de residência com valências externas de qualidade, seja nos serviços públicos, seja nos transportes, seja no espaço ambiental envolvente.

Tudo isto foi mais conscientemente assumido  com o reconhecimento das múltiplas vantagens da reabilitação das cidades, num quadro de desenvolvimento sustentado, capaz de se afirmar pela conjugação de várias vontades, entre as quais – repito o que também já disse – as vontades das instituições de crédito como instrumentos do crescimento em qualquer economia.

Tudo isto – o retrato das famílias portuguesas e do que eles querem ter e algumas já têm, o contexto desta mesma realidade, parte incentivada pelo Estado -, tudo isto devia ser equacionado na hora de se desenhar um quadro fiscal sobre o património construído, especialmente sobre o património que a maioria das famílias portugueses tiveram de adquirir para poder habitar convenientemente.

Tudo isto será muito próprio de um país onde muitos ainda se comovem a ouvir  Amália Rodrigues cantar “(…) Quatro paredes caiadas, // Um cheirinho à alecrim, // Um cacho de uvas doiradas, // Duas rosas num jardim (…)”. Gostando-se ou não deste fado o que não podemos ignorar é que o país foi sendo reconstruído assim.

Luís Lima
Presidente da CIMLOP
presidente@cimlop.com

Publicado no dia 31 de Outubro de 2016 no Jornal i

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