Diz-se que o facto de terem nascido em Portugal mais meninas do que meninos durante a guerra em que o país esteve envolvido em África, quando o serviço militar era obrigatório e exclusivamente masculino, terá sido uma realidade determinada pela intrínseca vocação maternal da defesa dos filhos. Defendê-los melhor, seria gerar meninas em vez de meninos.

Utilizo o tempo verbal “terá sido” por não saber, com o rigor das estatísticas, se naquele período nasceram ou não, em Portugal, mais meninas do que meninos. Tampouco posso garantir, embora não me repugne acreditar que sim,  que haja qualquer mecanismo nos seres humanos capaz de determinar o sexo dos filhos por uma qualquer vontade, mesmo que oculta.

Mais prosaico e menos envolto nos mistérios da natalidade, são os números que o  Instituto Nacional de Estatística (INE) revelou recentemente sobre o nosso envelhecimento colectivo, ou seja, sobre o envelhecimento da população portuguesa que, nos últimos 20 anos, não substituiu quase um milhão de jovens que entretanto se tornaram adultos.

Por outras palavras, há tendencialmente, em Portugal, menos gente em idade activa e mais gente da terceira idade, apesar da percentagem de pessoas que ingressaram, nesse período de vinte anos, no mercado de trabalho, ter aumentado, no caso pela via da chegada a este mercado de muitas mulheres que tradicionalmente só trabalhavam em casa e não eram contabilizadas.

Hoje, em Portugal, há mais velhos do que jovens e adolescentes, ao contrário do que acontecia há 20 anos, numa inversão que só não é ainda mais acentuada (e consequentemente mais deprimente) graças ao contributo da população imigrante que rejuvenesce Portugal, numa retribuição que raramente reconhecemos.

Este retrato de um Portugal envelhecido, de um Portugal onde cerca de um milhão de imóveis (sensivelmente 20% do parque habitacional) está em ruínas ou carece de obras de manutenção profundas, tem de ser urgentemente retocado, como as velhas fotografias de velhos álbuns desbotados pelo tempo.

Às vezes, olhamos para algumas dessas nossas memórias e reconhecemos, sem nostalgia, que nessas determinadas épocas estávamos “velhos e acabados”. Nesses momentos temos de reagir, quase tão uterinamente, como as mães que, nos idos dos anos 60 do século passado, geravam mais meninas do que meninos para não alimentarem a guerra.

Há 50 anos tentávamos contrariar a vontade de ser um país excessivamente jovem, especialmente se maioritariamente masculino. Hoje, temos de recuperar a vontade e a alegria de viver, descobrindo o nosso elixir da eterna juventude, e temos de recusar todo e qualquer retrato de país velho e acabado, como alguns retratos que nos tentam impingir à força.

Tudo, mas mesmo tudo, incluindo o renascimento do sector da Construção e do Imobiliário, pela via da reabilitação dos centros urbanos e do que está ligado a este projecto, tudo passa por aqui. Por esta recusa de um envelhecimento precoce. Afinal, somos um povo que só tem nove séculos de história.

Luís Carvalho Lima
Presidente da Direcção Nacional da APEMIP

Publicado dia 7 de Janeiro de 2010 no Sol

Translate »