Quando se iniciou a retoma do sector imobiliário em Portugal, depois de um longo e duro período de estagnação influenciado pela crise económica, e o sector financeiro voltou a revelar maior abertura dos bancos ao empréstimo para a habitação, questionava-se se as descidas das taxas de juro que se verificaram poderiam, a prazo, trazer de volta os problemas que o mercado imobiliário português tinha acabado de enfrentar.
Havia o receio de que os bancos voltassem às práticas erráticas do passado, tais como as sobrevalorizações de imóveis a financiar ou o pouco rigor na avaliação da taxa de esforço das famílias, receio este que acabou por se esbater pois provou-se que, tanto o sector financeiro como o mercado, estão bem conscientes dos erros que foram cometidos.
Ainda assim, na passada semana, o Banco de Portugal reforçou que não quer quaisquer facilitismos na atribuição de crédito à habitação, admitindo inclusive dificultar o seu acesso, devido às preocupações crescentes com o aumento nas concessões de crédito e com eventuais facilidades com que os mesmos poderão estar a ser atribuídos.
O supervisor revela também inquietações sobre os desenvolvimentos de preço no mercado imobiliário português, que poderão acarretar riscos para a estabilidade financeira, na medida em que conduzem ao relaxamento dos critérios de concessão de empréstimo.
Esta é uma preocupação que também está do lado do mercado e que eu próprio já tinha revelado em alguns eventos públicos da APEMIP, uma vez que nenhuma subida abrupta de preços traz com ela bons augúrios. O ideal e desejável, tanto para o mercado, como para os consumidores, é que haja um crescimento sustentável, que evite especulações e eventuais dinâmicas que comprometam o futuro de um sector que tem todas as condições para se manter como um dos principais pilares económicos do País durante muitos anos.
A concessão de crédito responsável, através de uma análise fina e adequada à taxa de esforço das famílias, é condição sine qua non para que o mercado permaneça sem sobressaltos que resultem num aumento exponencial do endividamento dos portugueses, e tem de ser uma das bandeiras do sector financeiro, lado a lado da promoção de uma maior transparência das avaliações imobiliárias.
Esta transparência, far-se-á, por exemplo, através da portabilidade das avaliações (prevista em projeto de lei proposto pelo grupo parlamentar do PS), cuja intenção será de conduzir a um maior rigor e fiabilidade das mesmas, que deverão ser efetuadas por peritos independentes devidamente certificados, sendo que uma mesma avaliação passaria a ser válida em quaisquer instituições de crédito, havendo uma maior proteção do consumidor (que não terá que solicitar e pagar diversas avaliações ao mesmo imóvel, se este fosse avaliado por diferentes instituições) e uma maior transparência do mercado, por evitar potenciais flutuações que a interpretação dos critérios de avaliação pudessem ter na avaliação conferida.
Apesar do alarme do banco central, há que reforçar que, apesar de tudo, o mercado aprendeu com os erros do passado, e a prova disso é que nos anos de pico das transações imobiliárias (antes da crise), o sector financeiro chegou a emprestar dois mil milhões de euros mensais para compra de habitação, ao passo que hoje esta média ronda os 700 milhões de euros, cerca de um 1/3 do que acontecia no passado.
As preocupações são válidas e o mercado exige cautelas, mas também devemos elevar que as lições do passado tiveram resultados na ação do presente.
Luís Lima
Presidente da APEMIP
luislima@apemip.pt
Publicado no dia 13 de dezembro no Jornal Público