Não há dúvida de que a opção por casa própria continua a ser a preferida dos cidadãos portugueses, diria até que é quase uma questão culturalmente enraizada. A aposta no mercado de arrendamento é, regra geral, uma alternativa para os jovens e para as famílias que não conseguem reunir as condições necessárias à aquisição de um imóvel. Só uma pequena percentagem das pessoas procuram arrendar imóvel por opção. 

Durante os anos mais dolorosos da crise, assistimos a uma migração do paradigma da compra e venda para o do mercado de arrendamento, fazendo com a que a procura por este último crescesse, em detrimento do primeiro, aproximando-nos até da grande maioria dos países europeus, que privilegiam o arrendamento. No entanto, este aumento da procura justificou-se maioritariamente pelo encerramento da torneira do crédito à habitação pela banca, que levou as famílias a terem que procurar alternativas para viver.

Agora que o mercado imobiliário está num período de ascensão e as condições de crédito estão a melhorar, a procura voltou a virar-se para a compra e venda, fazendo com que o mercado de arrendamento perdesse representatividade, fenómeno para o qual tenho vindo a alertar nos últimos dois anos.

A preferência pela propriedade privada é um dos motivos, mas o principal prende-se com as várias décadas passadas de um mercado de arrendamento ineficaz, e com diversos entraves, aos quais continuamos a assistir nos dias de hoje, tais como os valores das rendas que se praticam, em especial, nas principais cidades do país, que não competem de maneira nenhuma com os valores de uma prestação do crédito à habitação. 

Para que existisse uma procura pelo mercado de arrendamento motivada pela própria vontade de arrendar, os valores das rendas teriam que ser revistos por forma a serem competitivos com os de uma prestação bancária do crédito à habitação, devendo para isso sofrer uma diminuição na ordem dos 30 a 40%. 

Mas, para isso é fulcral que seja adotada uma tributação mais justa para os proprietários, que atualmente são tributados em sede de IRS ou por via da taxa liberatória, criando um cenário de dupla tributação aquando o pagamento do IMI.

Idealmente, a colecta do IMI deveria ser dedutível à colecta do imposto resultante dos rendimentos obtidos no arrendamento urbano, pois isso acabaria por criar uma maior confiança aos proprietários e a quem investe no imobiliário gerando assim um mercado de arrendamento com maior dimensão, não havendo deste modo perda, mas sim aumento de receita para o Estado. 

Há muito que os problemas do mercado de arrendamento estão identificados, no entanto, há quem continue a cair na infeliz tentação de distribuir culpas a quem não as tem, como ao alojamento local que tem sido o bode expiatório preferido para justificar os preços praticados no mercado de arrendamento “normal”, ou, pasmem-se aos chamados “intermediários”, como li na passada semana.

Só mesmo quem não conhece o mercado poderá acusar estes “intermediários” de serem os responsáveis pelo aumento dos valores das rendas e dos preços dos ativos no mercado quando, na verdade, só poderiam ser criticados se fosse pelo sentido oposto, ou seja, no seu habitual estímulo à baixa de preços em prol da rapidez na realização dos negócios.

Muitos suspeitos, quando o culpado é só um: o excesso fiscal.

Luis Lima
Presidente da APEMIP
luislima@apemip.pt

Publicado no dia 1 de Março de 2017 no Público

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