Por sorte nossa, os estudos e as projeções que o Banco de Portugal (BdP) regularmente elabora e publica, sobre a nossa realidade económica, não encontram eco tão mediático como o que têm sido dado às recentes intervenções públicas do Governo nesta operação de divulgação, em prestações nada suaves, da austeridade que nos espera.

Está em curso, dizem alguns desses recentes estudos do BdP, uma série de transvases no crédito concedido às empresas. Este terá atingido, nos primeiros sete meses do ano, o valor mais elevado desde 2008 (aproximadamente 28 mil milhões de euros), mas com a especificidade do crédito concedido às grandes empresas ter crescido 30%, em claro contraste com o crédito concedido às PMEs que caiu 7%.

Imagine-se o que aconteceria (pelo menos à nossa autoestima já tão abalada) se todos os jornais, telejornais e jornais da rádio incluídos, abrissem algumas das respetivas edições com grandes parangonas a dizer que nunca, como nos últimos quatro anos, foi concedido tão pouco crédito às empresas de menor dimensão. 

As grandes empresas captam quase 60% do crédito concedido às empresas, embora sejam as pequenas e médias empresas as que mais contribuem para contrariar os números do desemprego, ao contrário dos grandes grupos mais empenhados na redução dos respectivos recursos humanos em nome das mais variadas sinergias e de outros atropelos às obrigações sociais das empresas.

A situação é tão difícil e tão grave (para usar uma expressão recentemente utilizada, noutro contexto, pelo senhor Ministro das Finanças), que as próprias instituições financeiras poderão vir a sofrer com os efeitos indesejáveis que a redução do crédito às pequenas e médias empresas muito provavelmente irá gerar – mais desemprego e mais inadimplência, essa palavra cara que traduz essa outra situação, cada vez mais vulgar, da falta de cumprimento.

É pena que, a lei de Stevin (teorema da Física que estabelece que a pressão que se exerce sobre um líquido não depende da forma do recipiente em que esse líquido está contido) não se aplique em matérias como a da distribuição do crédito disponível para financiamento da Economia. É que, a Natureza parece ter soluções mais equilibradas para tudo – a regra é a dos vasos comunicantes a colocar o líquido homogéneo à mesma altura, independentemente da espessura do recipiente, e não a exceção dos transvases, onde se tira de um lado para por noutro.

Acresce, no atual contexto, que a haver alguma discriminação positiva em matéria de rateio do crédito disponível, deveria ser adotada precisamente ao contrário, ou seja, mais para o lado das pequenas e médias empresas do que para o lado dos grandes grupos económicos. Para bem de todos, incluindo os grandes grupos.

Luís Lima

presidente da APEMIP

luis.lima@apemip.pt

Publicado no dia 17 de setembro de 2012 no Diário Económico

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