Um Orçamento de Estado não pode ser transformado numa arma de arremesso, mesmo que este documento enquadre algumas das margens de actuação dos Governos, e, até indirectamente, das oposições e das forças políticas e sociais que dele também possam depender, como será o caso, por exemplo, da Função Pública cujas progressões de carreira ou aumentos salariais dificilmente se concretizarão se não estiverem previstos no OE.

Há quem diga que é nas ante-vésperas da sua elaboração que devemos revelar os argumentos que possamos ter para, em menor ou maior escala, conseguir influenciar aqueles que podem ter uma palavra a dizer em sede de Orçamento de Estado. Mas mesmo nesta cómoda posição de quem está de fora, todos temos de interiorizar que o OE deve assumir-se, em primeiro lugar, como um instrumento viável para o desenvolvimento do país.

Claro que temos obrigação de dizer, por exemplo, que o alívio da carga fiscal no imobiliário, seja a mais do que atrasada extinção do moribundo e injustificável Imposto Municipal sobre a Transmissão Onerosa de Imóveis (IMT, vulgo antiga Sisa), seja uma maior equidade na fiscalidade dos rendimentos provenientes do imobiliário ou sejam outros incentivos, são sempre mais do que legítimos se contribuírem para um desenvolvimento sustentado do país.

Na verdade, a inexistência ou a escassez de incentivos, nomeadamente no domínio da fiscalidade, que impulsionem a mais do que urgente reabilitação dos centros urbanos, é um travão ao desenvolvimento, sendo que a sua concessão jamais poderá ser considerada como uma benesse dada, a quem possa ter tido a arte de influenciar, neste sentido, uma das rubricas do famigerado Orçamento de Estado.

Num Orçamento de Estado capaz de ver para além dos números, puros e duros, a possível diminuição do IVA nos materiais de construção utilizados na reabilitação dos centros urbanos (é apenas um exemplo) pode ser uma medida muito positiva para a economia do país, num quadro de crescimento e de desenvolvimento desejáveis. Bom orçamento é aquele que serve estes interesses gerais, acima dos interesses particulares e corporativos.

Neste quadro só posso sublinhar, tentando dar-lhes ainda mais força, as palavras que têm sido ditas no sentido de alertar para a necessidade dos consensos em torno de matéria tão delicada, num quadro como a presente situação económica e financeira de Portugal, nomeadamente quando se sabe das dificuldades em obter financiamentos no exterior.

Antigamente, quando os Orçamentos de Estado ainda se chamavam Contas Gerais do Estado, e eram apresentados, não em formato informático, mas em papel, ou seja, em volumosos livros, tipo listas telefónicas, é que estes documentos tinham peso para poderem ser considerados armas de arremesso.

Luís Carvalho Lima
Presidente da Direcção Nacional da APEMIP

Publicado dia 3 de Setembro de 2010 no Sol

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