Há dias, num restaurante de Matosinhos que faz gaveto entre a Avenida Serpa Pinto e a Rua Roberto Ivens, restaurante onde sou cliente habitual e tratado como um amigo, tive o privilégio de almoçar, acompanhado, numa mesa de um dos cantos, perto de uma outra onde almoçou um casal de turistas brasileiros que não escondia o encanto pelo peixe que tinham escolhido e pelo vinho branco que, a pedido, lhes foi aconselhado.

Fazendo jus á época, foram servidos ao casal, à sobremesa, dois cálices de um Porto com 10 anos, numa boa e equilibrada escolha que recaiu num vinho da mesma casa do branco de mesa que acompanhou o peixe – uma, como se diz, autêntica cereja sobre o bolo na primeira apreciação que os clientes (paulistas, viria a saber pouco depois) fizeram de um bom almoço num restaurante de serviço irrepreensível.

Acontece que na minha mesa – por uma gentileza externa que não vem para o caso referir – bebia-se, a acompanhar uma rabanada, um Port Wine ou, para ser mais rigoroso, um vinho generoso, de colheita única e da minha idade, isto é, com mais algumas décadas do que aquele belo Porto com dez anos de idade que serviram aos turistas brasileiros, e eu, com a devida permissão do gerente da casa, ousei oferecer-lhes dois cálices da vintage com a minha idade.

Como quem faz um brinde a bons amigos que nos visitam e que almoçam à nossa mesa, no caso turistas que já conhecem e gostam de Portugal, que falam a nossa língua, e que se aventuraram, numa nova viagem ao nosso país, pelo Porto e pelo Norte. Para nós, portugueses, todos os turistas que nos visitam, são nossos amigos e merecem o tratamento que reservamos aos que queremos receber bem. 

Os dois cálices de Porto da minha idade que saltaram da minha mesa para a mesa do lado estabeleceram, de imediato, pontes entre as pessoas, fizeram trocar informações, mesmo que de circunstância, abriram sorrisos e criaram um momento que perdurará na memória dos nossos amigos paulistas, e nas nossas próprias memórias, muito para lá dos breves dias da viagem daqueles turistas brasileiros ou da nossa pausa entre o Natal e o Ano Novo.

Quando dizemos – e eu digo-o muitas vezes – que o Estado também somos nós, ancorados na ideia de que um Estado é um território geográfico bem definido onde vive uma população que tem muitos interesses em comum e fala a mesma língua, estamos a abrir caminho para podermos ser assim, ativamente abertos aos outros, sem receio do que os outros possam pensar por nos verem de forma diferente do vulgar.

Às vezes, para fazer a diferença, basta um cálice de Porto que, obviamente, terá de ser muito especial se for oferecido a quem está a beber outro Porto que sabemos, pelo conhecimento que temos das casas e das respetivas ofertas, ser já muito bom. Não esquecendo que um cálice de Porto para ser especial nem precisa sempre de ser da minha idade. Basta ser oferecido com a autenticidade de quem gosta de receber bem. Neste exemplo, o ótimo nunca é inimigo do bom.

Um bom 2016 para todos, incluindo o casal brasileiro com quem já brindei com um Porto da minha idade.

Luís Lima
Presidente da CIMLOP

Publicado no dia 08 de Janeiro de 2016 no Sol

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